A língua é um organismo vivo em constante evolução, e compreender suas mudanças ao longo do tempo é fundamental para a linguística. Para analisar essas transformações, a linguística utiliza duas abordagens principais: a sincrônica e a diacrônica. A perspectiva sincrônica concentra-se no estudo da língua em um determinado momento, enquanto a diacrônica observa sua evolução ao longo do tempo (BIZELLO, 2019).
No Brasil, a perspectiva sincrônica predomina, em parte devido à importância dada à fala em relação à escrita. Essa ênfase na fala está relacionada às ideias de Ferdinand de Saussure, que considerava o aspecto sincrônico como a realidade verdadeira para os falantes (BIZELLO, 2019).
No entanto, a análise diacrônica também desempenha um papel crucial na compreensão da evolução da língua. Isso envolve o estudo de documentos escritos antigos, o que foi central para o desenvolvimento da filologia, uma ciência rigorosa que investiga esses registros. A filologia inicialmente se concentrou na análise de documentos escritos antigos, mas posteriormente expandiu seu escopo para estudar o desenvolvimento de famílias de línguas e línguas individuais (BIZELLO, 2019).
Método histórico comparativo
A abordagem histórica trouxe à tona o método histórico comparativo, que permitiu a compreensão das leis fonéticas e da imutabilidade das mesmas. Isso levou a uma tensão entre as perspectivas diacrônica e sincrônica no início do século XX, com os pesquisadores diacrônicos sendo chamados de neogramáticos por seus rivais (BIZELLO, 2019).
Os neogramáticos contribuíram significativamente para o estudo histórico da linguagem, enfatizando que as mudanças linguísticas eram impulsionadas por forças fisiológicas e psíquicas. Eles consideravam que as leis fonéticas não tinham exceções e que todas as mudanças eram resultado de empréstimos ou analogias (BIZELLO, 2019).
No entanto, outros linguistas argumentaram que as mudanças linguísticas ocorriam de forma gradual e variável em diferentes contextos. Essa rigidez metodológica impulsionou o desenvolvimento da linguística histórica, que começou a considerar não apenas a escrita, mas também a fala. Os estudos sobre o sânscrito também contribuíram para essa mudança de foco (BIZELLO, 2019).
Ferdinand de Saussure, apesar de ter herdado influências dos neogramáticos, priorizou a abordagem sincrônica em seu Curso de Linguística Geral. Isso permitiu que ele analisasse as relações entre os elementos do sistema linguístico em um momento específico, contribuindo para a descrição da gramática de uma língua e o estabelecimento de princípios fundamentais (BIZELLO, 2019).
Em resumo, os estudos sobre a evolução da língua proporcionaram valiosas contribuições para a linguística, permitindo uma compreensão mais profunda das mudanças linguísticas ao longo do tempo e das relações entre significante e significado.
As Línguas Latinas
Origens e Evolução
- Latim Vulgar: O ponto de partida é o latim vulgar, uma forma simplificada do latim clássico usada pelas classes menos educadas em Roma. Essa forma simplificada incluía mudanças fonéticas, gramaticais e léxicas em comparação com o latim clássico.
- Separação Geográfica: Com o colapso do Império Romano, as populações falantes de latim vulgar ficaram geograficamente separadas, o que levou a diferentes caminhos de evolução linguística. Cada região desenvolveu seu próprio dialeto baseado no latim vulgar.
Exemplos e Comparação:
- Espanhol: O espanhol (castelhano) evoluiu principalmente a partir do latim vulgar falado na Península Ibérica. Um exemplo de evolução é a transformação do som “f” latino em “h” em algumas palavras, como “hijo” (filho).
- Francês: O francês evoluiu a partir do latim vulgar falado na Gália. Uma característica notável é a perda da maioria das terminações de palavras e a evolução de sons, como a transformação do “k” latino em “ch,” como em “cheval” (cavalo).
- Italiano: O italiano se desenvolveu a partir do latim vulgar na região da Itália. Uma característica marcante é a preservação de muitos sons vocálicos, como em “mare” (mar).
- Português: O português teve sua origem no latim vulgar da Península Ibérica, assim como o espanhol, mas com influências adicionais de línguas germânicas e árabes. Exemplos incluem a evolução da palavra “hominem” para “homem.”
- Romeno: O romeno é uma língua românica oriental, que se desenvolveu na região dos Bálcãs com influências do latim, do grego e do eslavo. Um exemplo é a palavra “copil” (criança), que tem raízes latinas.
Dialetos e Variações
Cada uma dessas línguas tem seus próprios dialetos e variações regionais. Por exemplo, dentro do espanhol, há diferenças entre o espanhol da Espanha e o espanhol latino-americano. O mesmo ocorre com outras línguas latinas, cada uma com suas variações regionais.
O latim vulgar deu origem a várias línguas e dialetos ao longo dos séculos. Aqui está uma lista das principais línguas e dialetos que evoluíram a partir do latim vulgar:
- Línguas Românicas Ocidentais:
- Português: Falado em Portugal, Brasil, Moçambique e outras nações lusófonas.
- Espanhol: Falado na Espanha e na América Latina.
- Galego: Um dialeto do noroeste da Espanha.
- Catalão: Falado na Catalunha, na Comunidade Valenciana e nas Ilhas Baleares.
- Galego-Português Antigo: Um ancestral do português e do galego, falado na Idade Média.
- Línguas Românicas Orientais:
- Italiano: Falado na Itália, San Marino e partes da Suíça e da Croácia.
- Romanche: Falado em partes da Suíça.
- Romaniano (Dálmata): Uma língua extinta, falada historicamente na região da Dalmácia.
- Línguas Românicas Setentrionais:
- Francês: Falado na França, Bélgica, Canadá, Suíça e outras nações francófonas.
- Normando: Um dialeto do norte da França.
- Valão: Falado em algumas regiões da Bélgica.
- Francês Canadense: Variantes regionais do francês falado no Canadá.
- Cajun: Um dialeto do francês falado na Louisiana, EUA.
- Línguas Românicas Meridionais:
- Romano: Línguas românicas faladas na Romênia, incluindo o romeno.
- Romanês: Um grupo de dialetos românicos falados nos Bálcãs.
- Dálmato: Uma língua românica extinta falada na Dalmácia (atual Croácia).
- Línguas Românicas Insulares:
- Sardo: Falado na Sardenha, Itália.
- Córsico: Falado na Córsega, França.
- Siciliano: Falado na Sicília, Itália.
- Línguas Românicas Extintas:
- Mozárabe: Uma língua românica extinta falada no sul da Espanha.
- Galo-romano: Diversos dialetos românicos falados nas regiões que hoje compreendem a França, a Bélgica e partes da Suíça.
- Istrio: Uma língua românica extinta falada na península de Ístria, Croácia.
- Dálmato: Como mencionado anteriormente, uma língua românica extinta.
- Línguas Românicas Crioulas:
- Cabo-Verdiano: Uma língua crioula baseada no português, falada em Cabo Verde.
- Papiamento: Uma língua crioula baseada no espanhol e no português, falada em Aruba, Curaçao e Bonaire.
- Línguas Românicas Menores:
- Mirandês: Falado em Miranda do Douro, Portugal.
- Ladino: Uma língua românica falada pelos judeus sefarditas.
- Línguas Românicas Africanas:
- Crioulo do Cabo Verde: Além do cabo-verdiano, há vários crioulos baseados no português falados em Cabo Verde.
- Papiamento de Suriname: Uma variante do papiamento falada no Suriname.
- Chabacano: Crioulos baseados no espanhol falados nas Filipinas.
- Línguas Românicas Americanas:
- Portunhol: Uma mistura de português e espanhol falada em regiões de fronteira entre o Brasil e a Espanha.
- Espanhol Americano: O espanhol falado nas Américas desenvolveu características distintas em diferentes regiões.
Lista das línguas românicas, seus dialetos, variações regionais e o número aproximado de falantes:
- Português
- Português Europeu: Falado em Portugal e regiões vizinhas da Espanha.
- Português Brasileiro: Falado em todo o Brasil (mais de 200 milhões de falantes).
- Português Angolano: Falado em Angola (cerca de 30 milhões de falantes).
- Português Moçambicano: Falado em Moçambique (mais de 20 milhões de falantes).
- Português Cabo-Verdiano: Falado em Cabo Verde (cerca de 500 mil falantes).
- Português Guineense: Falado na Guiné-Bissau (cerca de 2 milhões de falantes).
- Português São-Tomense: Falado em São Tomé e Príncipe (cerca de 200 mil falantes).
- Português Timorense: Falado em Timor-Leste (cerca de 1 milhão de falantes).
- Português Macaense: Falado em Macau, China (comunidade pequena).
- Espanhol
- Espanhol Europeu: Falado na Espanha (cerca de 47 milhões de falantes).
- Espanhol Latino-Americano: Diversas variações regionais em toda a América Latina.
- Espanhol Mexicano: Falado no México (mais de 125 milhões de falantes).
- Espanhol Argentino: Falado na Argentina (cerca de 45 milhões de falantes).
- Espanhol Colombiano: Falado na Colômbia (cerca de 50 milhões de falantes).
- Espanhol Peruano: Falado no Peru (cerca de 30 milhões de falantes).
- Espanhol Chileno: Falado no Chile (cerca de 19 milhões de falantes).
- Espanhol Cubano: Falado em Cuba (cerca de 11 milhões de falantes).
- Espanhol Venezuelano: Falado na Venezuela (cerca de 32 milhões de falantes).
- Italiano
- Italiano Toscano: Dialeto original que deu origem ao italiano moderno.
- Italiano Padano: Falado no norte da Itália, incluindo o milanês e o veneziano.
- Italiano Central: Falado na região central da Itália, incluindo o romano.
- Italiano Meridional: Falado no sul da Itália, incluindo o napolitano e o siciliano.
- Francês
- Francês Padrão: Falado na França (cerca de 67 milhões de falantes).
- Francês Canadense: Diversas variações regionais no Canadá, incluindo o québécois.
- Francês Belga: Falado na Bélgica (cerca de 4 milhões de falantes).
- Francês Suíço: Falado na Suíça (cerca de 4 milhões de falantes).
- Francês Haitiano: Falado no Haiti (cerca de 11 milhões de falantes).
- Francês Antilhano: Falado nas Antilhas Francesas (varia de ilha para ilha).
- Romeno
- Romeno: Falado na Romênia (cerca de 22 milhões de falantes) e na Moldávia (cerca de 2,5 milhões de falantes).
- Catalão
- Catalão: Falado na Catalunha, Comunidade Valenciana, Ilhas Baleares e regiões de Aragão e Murcia, na Espanha (cerca de 9 milhões de falantes).
- Galego
- Galego: Falado na Galícia, Espanha (cerca de 3 milhões de falantes).
- Mirandês
- Mirandês: Falado em Miranda do Douro, Portugal (cerca de 15 mil falantes).
- Romanche
- Romanche: Falado em partes da Suíça (cerca de 60 mil falantes).
- Ladino
- Ladino: Falado por judeus sefarditas em várias partes do mundo (número variável de falantes).
- Outras Línguas Românicas Menores:
- Incluem línguas e dialetos menos conhecidos, como o Franco-Provençal, Occitano, Aranês, Siciliano, Sardo, Friulano, Língua Rética, Dalmático, entre outros.
Essa lista abrange as línguas românicas mais proeminentes e algumas variações regionais significativas. Línguas e dialetos românicos menores podem ser encontrados em várias partes da Europa e do mundo, cada um com sua própria história e características únicas. O número de falantes é aproximado e pode variar com o tempo.
A abordagem histórica pelo método histórico comparativo permite aos linguistas traçar as origens e as transformações das línguas latinas ao longo dos séculos. Ela revela como essas línguas evoluíram a partir do latim vulgar e como desenvolveram suas próprias características únicas. Além disso, demonstra como as diferenças regionais e os dialetos contribuíram para a diversidade linguística nas línguas latinas.
Referência
- Bizello, R. F. (2019). As contribuições dos estudos sobre a evolução da língua. [Inédito].