
Estou certo de que ele é único. Nada e ninguém se coloca a seu lado, no seu modo de ser, na grandeza de sua alma. Caminhei com ele longos anos. Ele me descobriu adolescente e eu me despedi dele, triste e cabisbaixo, já adulto. Um e outro, no momento da descoberta e da despedida, sabiam das coisas. Lembro-me que, no instante da separação definitiva, não entendi bem a divisão que, naquele momento, Deus fazia comigo. Eu, por mais tempo que tenha podido usufruir daquela amizade, tive nenhum comparado à eternidade, à ausência de dias, ao mistério infinito que envolve o mistério. No entanto, acenei para ele. Dei-lhe o abraço e depositei inteiro na sua alma o meu coração. Talvez, por isso, me sinta tão envolvido de sua luz e me certifique cada vez mais de que “só seria como ele se tivesse sido ele!
MATEMÁTICA NO POEMA Soma? Para quê? Não há problema para resolver e o quociente que pode haver é primo; só se divide por ele mesmo ou por um. Quero algarismos no coração e muitas rosas nesta equação. Teorema fácil de demonstrar, sem qualquer fórmula, sem tese, antítese ou raciocínio. Basta a ternura que possas dar a paz imensa de teu olhar para que, ao final de tudo, coloques certo, como queríamos demonstrar. (15.10.1972)
Há no meu escritório uma foto dele. Montado, parece mais um fazendeiro campeando animais perdidos que professor. Eram estas as suas duas partes: ensinar e cuidar de seus potros, seus pôneis.
Na sala-de-aula campeava almas, lustrava o coração de seus alunos e mirava fundo o olhar de cada um deles.
Roubava-lhes a verdade, sem cerimônia nenhuma, porque precisava lapidar ainda mais seus pequenos. Em casa,cuidava, com a sabedoria dos justos, de seus animais. Montava-os. Tratava-os. Ensinava-os a serem elegantes, sem contudo tirar deles a dignidade equina que possuíam.
Sinto cada dia mais que o meu velho e querido Victorino Machado brotou da natureza. Um elemento a mais? Uma forma nova? Ou um novo pastor? O certo é que este meu professor deixou, como legado único, a sua sensibilidade, para que pudéssemos descobrir na natureza a verdade que a Matemática não nos pôde ensinar.
Conteúdo retirado do livro: ESSAS FACES, MESMOS MESTRES, TANTAS PESSOAS (1985)