A lógica partidária brasileira adotou do modelo presidencialista americano o fortalecimento de uma grande máquina partidária que coopta líderes demagógicos num ardiloso trabalho do boss tupiniquim. Muito se lê e se escreve sobre críticas ao que chama de “presidencialismo de coalizão” brasileiro, mas poucos analisam as semelhanças como o modelo americano.
Neste sistema onde o presidente não pode governar sem consentimento (legal) do Congresso Nacional, a nomeação de centenas de milhares de cargos na máquina pública transformam este líder plebiscitário em um semideus distribuidor de glórias ou fracassos. Afastando-se do povo, de forma direta.
Spoil System
O termo “Spoil System” mencionado na obra “A Política Como Vocação” do sociólogo alemão Max Weber, em 1919, se refere a declaração do senador americano William L. Marcy, “to the victor belong the spoils” (ao vitorioso pertence o espólio).
Max, por sua vez, ao analisar a evolução partidária tanto na Inglaterra, quanto nos Estados Unidos identifica a distribuição de cargos “na administração federal aos partidários do candidato vitorioso” iniciada após a eleição do sétimo presidente americano Andrew Jackson.
Neste sistema, o líder carismático, eleito com a maioria dos votos da população, conta com o serviço obscuro do que chamou de “boss”, o homem capitalista responsável por conseguir o financiamento das eleições.
Seu papel é articular a obtenção de recursos financeiros para o partido, driblando muitas vezes as imposições da legislação de controle de gastos de campanha. O famoso “toma lá, dá cá eleitoral” que tanto balbuciamos como invenção brasileira. Quando construtoras e empresas doadoras de recursos para a campanha de maneira lícita ou ilícita – por intermédio do boss – aparecem como beneficiadas em contratos governamentais.
Após esta genérica introdução, fica claro na “regra do jogo”, que um candidato, não é um candidato até que a máquina partidária o considere suficientemente relevante para a conquista dos votos e o, consequente, êxito eleitoral. Em alguns casos, por desajustes ou fraca representação partidária – a ordem deste processo é quebrada, mas com raros casos de sucesso.
Meia-boca
Um boss ou whip (assessor que faz a mediação entre o líder político e a comunidade, fazendo de fato o trabalho de patronagem e de clientela) se tornaram em muitas cidades (não só nas grandes metrópoles) candidatos eleitos e agentes de uma política sem líderes autênticos.
Neste caso, no Brasil, acelerado por imposições a velha liderança após o avanço da Lei da Ficha Limpa, o líder meia-boca acabou, por um golpe de sorte, vencedor e todos seus assessores e cabos eleitorais a serviço do partido ou do “projeto” passaram a corroer a engrenagem do sistema, visando, primordialmente, o sustento, deixando para um segundo plano a ideologia política, utilizada neste caso como justificativa da união de grupos e partidos em torno de um projeto de poder.
Assim como argumenta Weber, uma escolha deveria ser feita, naquele contexto:
ou se quer uma liderança política autenticamente vocacionada com fortes traços carismáticos ou se quer um político profissional sem qualidades de chefe. Os custos da primeira opção seria aceitar a existência da máquina nos partidos e, consequentemente, uma maior burocratização, já os custos da segunda opção seria uma política sem líderes autênticos.
Neste caso específico, um boss/whip, eleitos como “líderes sem autenticidade” não trouxeram novidades revolucionárias ao jogo político, mantiveram a utilização da máquina partidária e dos escambos de cargos políticos como prioridade em suas administrações, carentes de técnica ou mérito, e muitas vezes, criando em escala industrial cargos comissionados subestimados.
A obviedade e contemporaneidade do pensamento de Weber nos impõe uma dura realidade: seja qual for o sistema, ele estará fadado às peripécias dos interesses dos agentes envolvidos, mas, indo além, se pode refletir que uma Reforma Política, só trará novos cenários, no Brasil, com a mudança do regime presidencialista pelo parlamentarista, como condição para o fim do leilão de cargos na máquina. Porém, um salto para o abismo de incertezas quanto às reações que ocorrerão com a implantação deste sistema num país, onde a maioria dos partidos-clientes sofrem com um sistemático abandono de suas cartilhas ideológicas .
REFERÊNCIAS
1- Weber, Max. “A Política como vocação”. Em Ciência e política: duas vocações. São Paulo: Ed. Cultrix, 1993.
2- Princenton, U. Spoils System [acesso em 02 Mai. 2018]. Disponível em: https://www.princeton.edu/~achaney/tmve/wiki100k/docs/Spoils_system.html